A Comissão de Direitos Humanos e Segurança Pública da Assembleia Legislativa da Bahia vai apresentar, na terça-feira 31 de março, as conclusões da Comissão Especial da Verdade (CEV), encerrada em dezembro passado, numa audiência pública marcada para a mesma data em que os civis e militares golpistas de 1964 comemoravam a sua “revolução”. Em paralelo à divulgação do relatório às 9 horas na Assembleia Legislativa, o deputado Marcelino Galo, que presidiu a CEV, e nesta legislatura preside a comissão permanente que trata das questões ligadas aos direitos humanos, pretende imprimir um tom-resposta aos que hoje pedem intervenção militar, fazendo da audiência, um ato em defesa da democracia, comemorando os 30 anos do fim da ditadura.
“Será uma bela oportunidade de conhecer verdades do passado para refletir sobre os dias de hoje e sobre o futuro da nossa jovem democracia de apenas 30 anos”, prevê o deputado. A Comissão está convidando lideranças de partidos políticos, centrais sindicais, entidades estudantis e movimentos sociais para conhecer o quanto foi apurado sobre os 13 mandatos cassados durante a ditadura. Segundo Marcelino, houve um verdadeiro “apagão institucional, após as cassações, com a Assembleia Legislativa absolutamente silenciosa em relação ao que ocorria na Bahia e em todo o país”.
Depoimentos dos deputados foram a principal fonte –
A Comissão Especial da Verdade ouviu os quatro deputados cassados ainda vivos, e teve que lastrear seu trabalho a partir dessas fontes, segundo Marcelino Galo, “porque a Assembleia não preservou a documentação referente aos processos de cassação e pouco restou nos arquivos da Casa a respeito dos próprios parlamentares. Sebastião Nery foi ouvido em sua residência, no Rio de Janeiro, Marcelo Duarte e Luis Leal compareceram à Comissão e Wilton Valença deu seu depoimento em sua casa, em Salvador.
Ao contrário do ocorrido em outras casas legislativas, como o próprio Congresso Nacional, não houve desaparecimento ou tortura de parlamentares. A maior vítima de violência física foi o jornalista Sebastião Nery, mantido por alguns dias nas masmorras do Quartel do Barbalho. Em seu depoimento, o próprio Nery diz não considerar ter sido torturado, tendo em vista o que passaram diversos outros ativistas políticos.
Houve prisões arbitrárias e atabalhoadas, como a do decano professor Nestor Duarte, levado por engano pelos agentes da repressão em lugar do filho Marcelo, que era deputado. Luis Leal, que enfrentara os quartéis quando vereador, ao votar contra o impeachment do prefeito Virgildásio Senna, eleito em 1962, contou ter sido duramente perseguido no exercício da profissão de médico, depois de perder o mandato de deputado e os direitos políticos. Trabalhador da Petrobras, Wilton Valença foi demitido por justa causa sem inquérito administrativo e sem direito de se defender e também foi perseguido, passando a viver de biscates, após a cassação.
Homenagem a Wilson Lins –
O jornalista e escritor Wilson Lins, morto em 2004, é apontado por Sebastião Nery como um dos articuladores do golpe, entre civis. Integralista assumido e militante, Lins foi eleito presidente da Assembleia após as cassações, dando nome a um dos anexos da Casa, onde funcionam gabinetes dos deputados. Em seu depoimento, Nery reafirma fatos narrados em seu livro A Nuvem, e conta ter sido convidado por Lins para participar de reuniões conspiratórias, em unidades militares de Salvador, antes mesmo da derrubada do presidente João Goulart. O depoimento de Sebastião Nery é especialmente contundente ao apontar Wilson Lins como executor, na Assembleia Legislativa, das ordens vindas da 6a. Região Militar, escolhendo quem deveria ser cassado. O relatório da Comissão da Verdade aborda o assunto e trata da possibilidade de abrir o debate sobre a proposição da mudança do nome do prédio. Marcelino Galo adverte, no entanto, que "não pode haver precipitação para evitar injustiças”. A decisão sobre o encaminhamento do assunto, esclarece o presidente da Comissão, caberá à Assembleia Legislativa.